"Talvez me tenha acontecido uma compreensão tão total quanto uma ignorância, e dela eu venha a sair intocada e inocente como antes."
Clarice Lispector
Quebrando a escuridão ― é assim que revivo e que abraço outra vez o mundo como meu.
Voltando de Sodoma e Gomorra, de Atlanta.
Voltando das tórridas áreas da África onde Rimbaud mancou enquanto decifrava os homens em sua bela e pura forma descivilizada.
Quebrando a escuridão e também a natureza dos sábios do silêncio e dos mistérios ― é assim que correm outra vez pela escrita meus dedos sujos de amor e espanto.
Sei agora que é pelos períodos de sonambulismo que os homens vivem, quando não consideram nada absurdo ou relevante. É por esses hiatos de inanimação mental que a natureza se mantém.
O caos maior ainda é tentar entender que se vive, é tentar permanecer na batida desritmada do que não se fragmenta e não pode ser absorvido. Por isso ando ausente. Como os boêmios que não fazem música. Circenses que dormem ao dia.
Por isso tenho pensado em abster-me dos fenômenos e apenas vagar, como um Plutão fora de órbita. Como uma nau perdida um minuto depois de navegar pelo Cabo das Tormentas. Como você que apaga as luzes depois que a música começa.
Eis a falsa harmonia; a multiface da existência.
Eu sou eu enquanto estou em silêncio. Mas entender-se é o que define a forma da paixão dos seres.
E já não sou mais enquanto escrevo. Sou apenas e grandiosamente uma comunhão com o universo.
A célula-tronco que em mim vibra. O célebre hino que os cidadãos cantam. A celeste estadia dos cinturões. São essas as coisas que tento incorporar e que fogem enquanto digo. Como espumas. Como espasmos.
Mas isso já me é antigo. Era de antes. Era do corpo em que eu nasci.
Me vem Ginsberg, então, na mente, gemendo, "e a alma sobe feliz até o olho".
Sim, sim, eu voltei de Sodoma e Gomorra.
Eu era uma esperança flácida e decadente, flutuando como penas de blackbirds sobre o rio perene.
Eu era falante, exprimível ― Não. Eu imaginava ser. Algo sempre morre na garganta sem atingir a iluminação divina.
Por isso é necessário um certo luto. Um período de mudo: um período de cego. Sentindo a beat.
Para depois resgatar o que se entende.
E entendo. Sei outra vez como o espaço é simultâneo, como é multicor, e como estou ao léu.
Deus, deixa-me com minha voz. Deixa-me com minha angústia e o dom que padeço usar.
Sim, eu voltei ao meu fundamento.
Mariane Cardoso
P.S.: Desculpem a minha demora e a falta de notícias. E obrigada, de coração, por continuarem sempre presentes.
Ultimamente quando leio uma junção de belas palavras fico sem saber o que escrever. É como se as palavras que me absorvessem, e não eu a elas. Lindo Mari. Beijo de luz! (:
ResponderExcluirNão suma mais.
ResponderExcluirFiquei tão feliz em ver um outro texto seu...
E que bom que voltou.
ResponderExcluirVocê é linda guria! Permaneça!
ResponderExcluirQue bom que você voltou, a aflição já estava tomando conta de mim. Espero que esteja tudo bem por aí, você fez falta! -23
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